Estão abertas as inscrições para mais uma edição
da Casa dos Degredos Segredos. Não a da TVI, embora não deva estar muito
longe de voltar acontecer, mas a de Venda de Belém, onde a corrida para
a qual parecia que não haveria candidatos está progressivamente mais completa.
Cavaco Silva abriu as inscrições quando creu que lhe ficaria bem delinear o
perfil do seu sucessor. Foi como colocar um anúncio de emprego. Tal como nesse
contexto, muitos tentam a sorte, com ou sem o perfil pretendido. Oficialmente,
o único candidato é Henrique Neto, empresário e militante do PS. Sampaio da
Nóvoa, ex-reitor da Universidade de Lisboa, prepara-se para apresentar a sua,
parecendo reunir alguns apoios à esquerda. Todavia, estes não serão presumivelmente
os nomes que sobejarão no fim, numa hipotética segunda volta, quando a corrida
se tornar verdadeiramente renhida. Os candidatos de peso aguardam na
expectativa. Por um lado, há os eternos candidatos da direita: Marcelo Rebelo
de Sousa, Pedro Santana Lopes, Rui Rio, Durão Barroso, Manuela Ferreira Leite.
Por outro, os da esquerda: António Guterres, Carvalho da Silva, António
Vitorino, Maria de Belém Roseira. E há ainda Paulo Portas, que segundo Santana
Lopes é uma “hipótese realista” para Belém (dependendo do que acontecer nas
legislativas e da disponibilidade de poleiros, claro). José Sócrates só não é
também candidato porque está preso. Destes dois ilustres grupos perdurará um de
cada. Como na Casa dos Segredos. A cada semana virão a público os “segredos” de
cada candidato até se chegar ao grupo mais restrito de finalistas que irá por
fim às urnas.
Não é apenas em Portugal que uma corrida presidencial
para 2016 começa a perfilar-se. Nos Estados Unidos, Obama ainda tenta deixar um
legado para a história (trocou um aperto de mão com Raúl Castro na Cimeira das
Américas no Panamá e reuniu-se em privado com o homólogo cubano, marcando o fim
de 50 anos de hostilidades e desforras), mas já são vários os nomes que querem
ocupar a sua cama na Casa Branca. Os abutres bem gostam de rondar corpos
moribundos à espera que se lhes esgote a vida para se apoderarem da sua carne e
dos seus bens. Depois dos senadores Rand Paul e Ted Cruz do partido
republicano, Hillary Clinton prepara-se para apresentar a sua candidatura à
nomeação do partido democrático. Poderá ser a primeira mulher presidente da
nação norte-americana. Também podia ter sido em 2008, mas um “ilustre
desconhecido” tomou a América de surpresa. Pode ser desta. Rand Paul está aterrado
com a possibilidade e deu início à troca de palavras, acusando os Clinton de
serem hipócritas e de acharem que estão acima de lei. Acima da lei parece estar
a polícia norte-americana após mais uma morte injustificada de um afro-americano.
Desta vez houve uma prova visual da acção policial homicida e foi possível
agir sobre o culpado. Mas nem sempre foi assim. Nem sempre será. Será um tema a
dominar a campanha eleitoral. A corrida vai ser nervosa. Nervosa como Alexis Tsipras
está a deixar os líderes europeus. Embora a Grécia tenha conseguido pagar ao
FMI a tranche de 450 milhões de euros que vencia na quinta-feira, o
primeiro-ministro grego mostra-se disposto a encontrar todas as alternativas ao
sufoco troikano. A próxima tranche vence a 12 de Maio e é de 746 milhões de
euros. Tsipras quer antecipar-se à bancarrota grega procurando em Vladimir Putin
o parceiro para sacudir a pressão. Tsipras quer retomar a troca comercial de
bens agrícolas que tem estado sob embargo desde o arrefecimento das relações
entre a União Europeia e Moscovo após o alinhamento da Ucrânia com Bruxelas. O
eixo ucraniano é um tema sensível para Moscovo e o apoio da Grécia,
contrariando a posição da União, é vista com muitos bons olhos. Moscovo até
promete fornecer gás mais barato à nação helénica.
Depois da cartada das indemnizações alemães
devidas pelos danos da 2ª Guerra Mundial, Tsipras jogou a carta russa. Esperemos
que não se transforme na roleta russa. Os líderes europeus também preparam a
sua cartada. Numa troca errada de emails, ficou a saber-se que a Finlândia, num
memorando assinado pelo seu ministro das finanças, está a preparar-se para o “grexit”,
como é conhecida a eventual saída da Grécia da zona euro. O ministro avisa que que
os políticos têm de estar preparados até Junho para a possibilidade de haver
uma falência grega e acrescenta que a União poderá ter de responder com a
expulsão da Grécia da zona euro através de uma "aprovação silenciosa de
outros países". Atravessamos uma guerra fria europeia. E pode aquecer. Enquanto
se trocam cartadas neste perigoso jogo de póquer, por cá celebramos o facto dos
juros da dívida portuguesa a dois anos terem sido negativos pela primeira vez,
o que quer dizer que os investidores estão dispostos a pagar para ter a nossa
dívida. Embora seja um feito importante, esta favorável evolução dos juros não
se deveu às políticas do governo, como o conjunto do Palácio da Ajuda tentou transparecer,
mas ao plano de Mario Draghi, que colocou o BCE a comprar directamente as
dívidas dos estados-membro, nulificando o risco dos investidores. A
desinformação é um veículo da governação, qualquer que ela seja. É talvez um
dos seus piores e mais terríveis veículos. No Coreia do Norte, por exemplo,
acredita-se agora que Kim Jong-un aprendeu a conduzir aos 3 anos. Toda a mentira
se torna verdade se for falsamente comunicada. Felizmente, há quem mantenha os
princípios da verdade e da liberdade. Assim foi Tolentino de Nóbrega durante
mais de 40 anos ao serviço do jornalismo madeirense e nacional. Tolentino de
Nóbrega não resistiu a uma doença oncológica e o jornalismo português perdeu um
dos seus heróis e ficou incontornavelmente mais pobre. Ficou a informação.
Ficou a liberdade. E ficámos todos também.
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