O Carnaval já passou e
vem aí a Páscoa. 40 dias medeiam. Em teoria, a palhaçada do primeiro dá lugar à
maior seriedade do segundo (para quem segue estas correntes religiosas), mas
não parece ser o caso da política portuguesa. Cavaco Silva, arquitecto do silêncio
presidencial, desenhou o perfil do seu sucessor. Mas não se pense que o senhor
dos silêncios rompeu com o seu dogma (afinal, foi por palavras escritas que
tentou escrever os seus mandamentos em pedra). Dá-lhe até “um pouco vontade de
rir quando alguns imaginam” que defendeu “qualquer perfil” para o futuro Presidente
da República. De rir estão os portugueses fartos. E não é só porque o Carnaval
já esteve aí à porta com as palhaçadas que lhe fazem parte. Temo-nos rido, e muito,
porque ainda não há imposto que reduza o nosso humor. Reduzidos ficaram os
sacos de plástico, com efeitos positivos para o ambiente e ainda melhores para
os retalhistas com prejuízos crónicos transformados em lucros súbitos (cerca de
3 cêntimos ao saco, segundo investigação do Contas-Poupança da SIC Notícias). E
também isso nos faz rir. Afinal, se já não se pode apertar mais o cinto sem
transformar o gesto em tortura, taxa-se a embalagem em que o cinto vem...pelo
menos enquanto não se pagar o oxigénio, mas um dia lá chegaremos.
Numa altura em que se descobre o desagrado do FMI por
quase não ter interlocutor (haja respeito!), Cavaco Silva faz-se à vaga declarando
que espera que a economia portuguesa cresça 2% em 2015. Para se perceber melhor
o seu optimismo, a sua previsão é como a de alguém que espera que um bolo cresça
sem lhe ter posto qualquer levedura (duvido que tenha ido sequer ao forno). Já
se viu de tudo (até Putin já reapareceu; ter-se-á lesionado a fazer mergulho no
Báltico?), mas desde a aparição de Fátima que não tem havido milagres para estes
lados. Será optimismo o que move Cavaco Silva, ou fé? Diz um provérbio chinês
que a palavra é prata, o silêncio é ouro. Cavaco Silva parece ter trocado ouro
por prata. A verdade é que a cotação do primeiro tem vindo a cair. E se o
petróleo também já não rende o mesmo, se calhar vale mesmo a pena investir na
prata (talvez Nelson Évora se quede pelo segundo lugar na próxima competição; o
meu Porto, pelo menos, não parece conseguir fugir-lhe).
Na Madeira arrancou a campanha eleitoral que elegerá
o sucessor de Alberto João Jardim. Consta que Passos Coelho não surgirá ao lado
de Miguel Albuquerque, candidato do PSD. Paulo Portas já por lá esteve em
Dezembro. António Costa por estes dias. E Marinho Pinto até já entrevista
Marinho Pinto por lhe ter sido negada a candidatura do Partido Democrático
Republicano pelo Tribunal Constitucional. Não se pense que se verá na Madeira o
que se viu na Grécia (e que pode vir a acontecer em França ou na Espanha). O
sucessor já estará à partida escolhido, mesmo que Alberto João Jardim lhe
mostre lealdade falsa. Noutras alturas, as eleições madeirenses serviam para os
partidos nacionais trocarem galhardetes. Desta vez parece haver desinteresse
generalizado. Passos nem quer saber. Talvez só pense nas suas próprias eleições. Talvez viva consumido com os sucessivos habeas corpus de José Sócrates (do
próprio e de outros cidadãos). Afinal, água mole em pedra dura… Ou quiçá a
manifestação sem precedentes contra o governo de Dilma lhe tenha mostrado que
nenhuma política está a salvo de uma população descontente. Seja o que for que
o apoquenta, Passos pode finalmente respirar de alívio sobre o “aborrecimento”
da Segurança Social. A oposição ladrou muito, mas António Costa mostrou que não
morde e deixou-o passar impune com um rol de perguntas que nem para ganhar o Quem
Quer Ser Milionário serviria. Talvez seja da Páscoa. Talvez se vá assistir de
facto a uma ressurreição, mesmo que a mais recente sondagem tenha indicado
novamente o calvário.
Quem não parece que vá ressuscitar tão cedo é Zlatan
Ibrahimovic. Depois da precoce expulsão em Londres, e no final de um jogo entre
o Paris Saint Germain e o Bordéus que terminou com a derrota dos parisienses
por 4-2 no terreno do adversário, o sueco revoltou-se contra a arbitragem e afirmou
que “este país de merda (a França) não merece um Paris Saint Germain”. O sueco
desculpou-se, mas Marine Le Pen, da Frente Nacional, já o convidou a abandonar
o país. Essa parece ser, aliás, a solução de Le Pen para tudo. É a sua política
e bandeira eleitoral num país que parece aos poucos e poucos virar-se para o
extremismo que no passado contestou e batalhou, sentimento reforçado pelo
terrorismo recente e pela sombra do Estado Islâmico. E por falar do auto-proclamado
califado, a leitura do relato do jornalista espanhol Javier Espinosa sobre o
seu cativeiro de 194 dias é indispensável. A parte mais assustadora do seu relato
não é a descrição do sofrimento, da tortura psicológica e da tortura física; é
a noção confirmada por Espinosa das raízes extremistas que estão a proliferar
na Europa e que recrutam militantes paras fileiras do Daesh. Falamos de jovens
com futuro promissor, de bons alunos, bons amigos, jovens que trocam o
ocidentalismo pelo terrorismo sem razão aparente. Falamos de jovens raparigas
ainda menores que viajam até à Turquia para poderem atravessar a fronteira para
a Síria e juntar-se ao califado, abdicando da liberdade que o ocidente lhes
oferece pela reclusão, submissão e escravidão que o Daesh promete na sua
interpretação livre do Corão. Que motiva estes jovens? Que fomenta estas ideias?
A Europa está à beira da mudança. Economicamente, politicamente,
socialmente. Não é só o lenço de Varoufakis ou a sua contestada produção para a
revista Paris Match a levantar ondas. Não é só a ameaça grega sobre o euro. É o
pensamento. É a filosofia. É o fim do fugaz sonho europeu. Onde fica Portugal
no meio disto tudo? À espera da Páscoa. Entre o optimismo de Cavaco e jogo de
gato e rato de Passos Coelho e António Costa. Entre sacos de plástico a 10
cêntimos. Entre risos. Afinal, os políticos também são à imagem da população
que (des)servem e nós também ladramos muito e mordemos pouco.
E assim Portugal pergunta ao Zé Povinho:
ResponderEliminar- Trouxeste saco?
E o Zé Povinho exclama alarmado a bater com a mão na testa:´
- Eh pah ... não!!!
E Portugal responde sorriso matreiro:
- Então anda que vais levar no pacote... 10 cent pf