sexta-feira, 24 de junho de 2016

Carta aberta à União

Como é que chegaste a isto? Falhaste. Estás a falhar. Estás a ruir pelos teus próprios alicerces. Toda a tua estrutura treme como algo que procura o equilíbrio perdido durante um terremoto súbito. Não há canto onde te abrigues. Estás ali no meio, no olho do terremoto, fustigada por ondas de choque que vêm de todos os lados e que vão para todos os lados. Só te resta subsistir, protegeres-te com as mãos dos objectos que voam, das paredes que caiem, do chão que te foge. Ai, pobre União, aí sozinha no meio do terremoto. Não há quem te valha? Não haverá quem te possa acudir? Não reconheces que és culpada do teu próprio fadário? Não reconheces que o alimentaste com a tua retórica torta, com o atropelar dos teus próprios princípios, com o teu foco cego, desmedido e indomável no freio orçamental que colocaste aos teus alicerces? Ó União, como não vês que este chão que se fende à tua frente e te coloca à beira de um abismo sem fim foi causado por ti mesmo. Fugiu-te um alicerce e desequilibrou-te a trave-mestra. Como é que o deixaste fugir? Como é que não soubeste prever que te desertaria se continuasses a fazer de conta com todos os problemas que afligiam a tua fundação, se continuasses unicamente preocupada com o freio orçamental que colocaste em todo o lado e que redobrou o peso e o esforço sobre cada alicerce? Como é que não viste que te desertaria se continuasses a ignorar a mudança de pensamento que floresceu em todo o lado, o crescente abandonar da entreajuda entre os teus alicerces, o erguer da aversão entre aqueles que ficam na parte de cima contra aqueles que ficam na parte de baixo?


Não viste nada. Continuaste a insistir no que já não surtia efeito. Substituíste a pedagogia pela demagogia, ameaçaste em vez de aliciares, focaste-te no que perdiam em vez do que ganhariam, falaste do dinheiro e da despesa em vez de falares dos princípios, da paz, da força e do futuro. O alicerce desconfiou do teu discurso torcido e abandonou a tua fundação. Agora tremes. Sofres um terremoto que não sabes como acabará, como te deixará no fim. Segura-te aos 27 alicerces que te restam. Redistribui o peso e volta a equilibrar a tua trave-mestra. Reconhece onde falhaste, onde continuas a falhar. Muda o teu discurso, a tua visão e a tua intenção. Volta às ideias que primeiro te ergueram e te transformaram num sonho corpóreo, que embelezaram por onde te construíste e apaziguaram por onde actuaste. Volta a essas ideias. Lembra-te do passado, do que foi antes de ti. Pensa no que pode voltar a ser sem ti. Tremes agora porque já não há nada a fazer. Caiu-te esse alicerce, esse que era um dos teus mais fortes e queridos. Deixa o orgulho de parte. Concentra-te no que importa. Aguenta essas ondas de choque que te afligem. Acredita nos alicerces que te sobram. Acredita que se mudares podes persistir. Tudo depende ti. Do que agora decidires. Nunca foi tão importante. Nunca tão concludente. O terremoto que te desequilibra será parte da história, mas essa história ainda está por escrever. Não temas. Enfrenta o desafio. Faz ruir as fronteiras que querem voltar a erguer-se, essas, malditas, que já tanto custaram. Dá a volta ao conservadorismo que te tornou negro o coração. Volta a inspirar. A apontar o caminho. Volta a levar longe aqueles que, sozinhos, agarrados ao seu único alicerce, nunca terão força para ir a lado nenhum. Volta a ser uma união e a escancarar as portas do futuro. Ainda acreditamos.